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terça-feira, 23 de junho de 2009

COM DIPLOMA E COM QUALIDADE

Marcos Fábio Belo Matos *

Acerca da desregulamentação da profissão de jornalista, fruto de entendimento do STF, seguem algumas reflexões, em pílulas:

1) ANACRONISMO – Do pouco seu viu, pode-se verificar que, em geral, a defesa legal que fizeram os ministros do STF é anacrônica e descontextualizada. Primeiro: o fato de somente jornalistas com diploma exercerem funções inerentes ao jornalismo não fere o direito à expressão; Segundo: dizer que jornalismo é mais arte que ciência remonta a uma discussão de, pelo menos, cem anos atrás, quando os literatos começaram a ocupar as redações dos matutinos e vespertinos. Os ministros provaram que ainda raciocinam com a cabeça no Brasil de Machado de Assis, Lima Barreto e Olavo Bilac;

2) DIPLOMA: Claro que o diploma, por si só, não garante a qualidade nem a integridade de um profissional da imprensa. Mas é inegável que ele traz, na sua gênese, uma presunção de competência de quem o ostenta no currículo. Conheço muitos médicos, dentistas, advogados, farmacêuticos, engenheiros, professores e tantos outros diplomados sem nenhuma competência – alguns até com um nível mental primário. Mas, se não têm competência, não é culpa do diploma, mas sim de decisão própria, de um percurso particular de (de)formação. O diploma, pelo menos, indica que eles tiveram que fazer o curso – e deveriam tê-lo feito com qualidade;

3) REGULAMENTAÇÃO – Ao contrário do que muitos defensores da extinção da obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo apregoam, a defesa não é por reserva de mercado, mas sim por um padrão mínimo de qualidade de quem trabalha para as notícias chegarem às nossas casas. No mundo extremamente complexo em que vivemos, entender a comunicação como fenômeno (e não meramente como técnica) é fundamental para quem se propõe a trabalhar, cotidianamente, com ela. Jornalismo é muito mais que escrever “com arte” (isso era do tempo de João do Rio ou João Lisboa!). E isso, essa capacidade de análise, quem dá é a universidade – além da técnica, é claro!;

4) FORMAÇÃO: Não conheço ninguém que, antes de fazer um curso, se pergunte algo como: “Será que este curso é regulamentado?”. Se assim fosse, não haveria profissionais formados em turismo, ciências imobiliárias, publicidade e propaganda, cinema, design – só para ficarmos em alguns mais conhecidos. As pessoas, geralmente, se perguntam é se o curso é bom, se tem laboratórios, se os professores são de qualidade etc. Ou seja: ter ou não ter a exigência de diploma de jornalismo não vai ser condição sine qua non para muitos que querem ser jornalistas. Claro que essa decisão acaba afastando muita gente do vestibular, mas acredito que, os que, de fato, querem ser jornalistas, vão ficar, perseverar, formar-se e encontrar seu lugar ao sol – que não precisará ser, necessariamente, embaixo da sombra de uma carteira de trabalho assinada... O mercado do jornalismo no Brasil é muito amplo e ainda está em (trans)formação.

5) INVOLUÇÃO – Nada disso, no entanto, seria necessário se o STF entendesse um princípio básico: uma profissão regulamentada há 40 anos, que já formou tantos profissionais de reconhecimento nacional e internacional, de tanta importância para a construção de uma democracia forte, precisa ser respeitada. A desregulamentação do jornalismo promove uma involução de pelo menos um século, além de deixar uma brecha para outras degolas. E quem vai sofrer com isso é a sociedade.

* Jornalista e professor do Curso de Jornalismo da UFMA/Imperatriz

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